Devem ter sido diferentes um dia,
fogo e água, diferindo com veemência,
sequestrando e se doando
no desejo, no assalto à dessemelhança.
Abraçados, apropriaram-se e expropriaram
por tanto tempo,
que nos braços restou o ar
translúcido depois do relâmpago.
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Um dia a resposta antecipou a pergunta.
Uma noite adivinharam a expressão do olhar do outro
pelo tipo de silêncio, no escuro.
.
O sexo fenece, os segredos se consomem,
na semelhança as diferenças se encontram
como todas as cores no branco.
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Qual deles está duplicado e qual aqui está faltando?
Qual sorri com um duplo sorriso?
A voz de quem ressoa nas duas vozes?
Quem assente quando acenam com a cabeça?
Com o gesto de quem levam a colher à boca?
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Quem arrancou a pele de quem?
Quem vive e quem morreu
enredado na linha — de qual mão?
.
Devagarinho, de tanto olhar, nascem gêmeos.
A familiaridade é a mais perfeita das mães —
não faz distinção entre os seus dois filhos,
mal recorda qual é qual.
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No dia das bodas de ouro, dia festivo,
uma pomba vista de forma idêntica pousou na janela.
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(Tradução Regina Przybycien)
Wislawa Szymborska | "Bodas de ouro".
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