Mostrando las entradas con la etiqueta Hilda Hilst. Mostrar todas las entradas
Mostrando las entradas con la etiqueta Hilda Hilst. Mostrar todas las entradas

sábado, 12 de agosto de 2017

Poeira, cinzas

Poeira, cinzas
Ainda assim
Amorosa de ti
Hei de ser eu inteira.
.
Vazio o espaço
Que me contornava
Hei de estar ali.
Como se um rio corresse
Seu corpo de corredor
E só tu o visses.
Corpo do rio? Sou esse.
.
Fiandeira de versos
Te legarei um tecido
De poemas, um rútilo amarelo
Te aquecendo.
.
Amorosa de ti
VIDA é o meu nome. E poeta.
Sem morte no sobrenome.
.
Hilda Hilst | "Poeira, cinzas".
.

Toma-me ao menos

Toma-me ao menos
Na tua vigília.
Nos entressonhos.
Que eu faça parte
Das dores empoçadas
De um estendido de outono
.
Do estar ali e largar-se
Da tua vida.
.
Toma-me
Porque me agrada
Meu ser cativo do teu sono.
Corporifica
Boca e malícia.
Tatos.
Me importa mais
O que a ausência traz
E a boca não explica.
.
Toma-me anômima
Se quiseres. Eu outra
Ou fictícia. Até rapaz.
É sempre a mim que tomas.
Tanto faz.
.
Hilda Hilst | "Toma-me ao menos".
.

viernes, 11 de agosto de 2017

Que este amor não me cegue nem me siga

Que este amor não me cegue nem me siga.
E de mim mesma nunca se aperceba.
Que me exclua do estar sendo perseguida
E do tormento
De só por ele me saber estar sendo.
Que o olhar não se perca nas tulipas
Pois formas tão perfeitas de beleza
Vêm do fulgor das trevas.
E o meu Senhor habita o rutilante escuro
De um suposto de heras em alto muro.
.
Que este amor só me faça descontente
E farta de fadigas. E de fragilidades tantas
Eu me faça pequena. E diminuta e tenra
Como só soem ser aranhas e formigas.
.
Que este amor só me veja de partida.

.
Hilda Hilst | "Que este amor não me cegue nem me siga".
.

E só me veja

E só me veja
.
No não merecimento das conquistas.
De pé. Nas plataformas, nas escadas
Ou através de umas janelas baças:
Uma mulher no trem: perfil desabitado de carícias.
E só me veja no não merecimento e interdita:
Papéis, valises, tomos, sobretudos
.
Eu-alguém travestida de luto. (E um olhar
de púrpura e desgosto, vendo através de mim
navios e dorsos.)
.
Dorsos de luz de águas mais profundas. Peixes.
Mas sobre mim, intensas, ilhargas juvenis
Machucadas de gozo.

.
E que jamais perceba o rocio da chama:
Este molhado fulgor sobre o meu rosto.

.
Hilda Hilst | "E só me veja".
.

Isso de mim que anseia despedida

Isso de mim que anseia despedida
(Para perpetuar o que está sendo)
Não tem nome de amor. Nem é celeste
Ou terreno. Isso de mim é marulhoso
E tenro. Dançarino também. Isso de mim
É novo: Como quem come o que nada contém.
A impossível oquidão de um ovo.
Como se um tigre
Reversivo,
Veemente de seu avesso
Cantasse mansamente.
.
Não tem nome de amor. Nem se parece a mim.
Como pode ser isso? Ser tenro, marulhoso
Dançarino e novo, ter nome de ninguém
E preferir ausência e desconforto
Para guardar no eterno o coração do outro.

.
Hilda Hilst | "Isso de mim que anseia despedida".
.

martes, 25 de abril de 2017

Ode VIII (Lenho, olaria, constróis)

Lenho, olaria, constróis
Tua casa no meu quintal.
E desde sempre te espio
.
Linhos e cal tua cara
Lenta tua casa
.
Nova crescendo agora
Nos meus cinqüenta.
E madeirames e telhas
E escadas, tuas rijezas
.
Tuas costas altas
.
Vezenquando te volteias
Para que eu não me esqueça
.
Do instante cego
.
Quando me pedirás companhia.
E não me esqueço.
Te espio de hora em hora
.
Casa e começo, tua cara,
A qualquer tempo te reconheço.
.
Hilda Hilst | "Ode VIII (Lenho, olaria, constróis)".
.

sábado, 15 de abril de 2017

Ode XXII (Não me procures ali)

Não me procures ali
Onde os vivos visitam
Os chamados mortos.
Procura-me
Dentro das grandes águas
Nas praças
Num fogo coração
Entre cavalos, cães,
Nos arrozais, no arroio
Ou junto aos pássaros
Ou espelhada
Num outro alguém,
Subindo um duro caminho
.
Pedra, semente, sal
Passos da vida. Procura-me ali.
Viva.
.
Hilda Hilst | "Ode XXII (Não me procures ali)".
.

viernes, 7 de abril de 2017

Ode XIII (Funda, no mais profundo do osso)

Funda, no mais profundo do osso.
Fina, na tua medula
No teu centro-ovo. Rasa, poça d'água
Tina. Longa, pele de cobra, casca.
Clara numas verticais, num vazado sol
Da tua pupila. Paciente, colada às pontes
Onde devo passar atada aos pertences da vida.
Em tudo és e estás.
.
Hilda Hilst | "Ode XIII (Funda, no mais profundo do osso)".
.

viernes, 31 de marzo de 2017

Ode XL (Lego-te os dentes)

Lego-te os dentes.
Em ouro, esmalte e marfim.
.
Entre sarrafos e palha
O baço dos meus ossos.
.
Procura na tua balança
Minha couraça. Meu bandolim.
Escrita e torso.
.
Pesa-me a mim. Minhas funduras
E o gume do meu desgosto.
.
Procura, na minha hora,
Entre sarrafos e palha
.
O que restou de mim
À tua procura.
.
Hilda Hilst | "Ode XL (Lego-te os dentes)".
.

Ode XI (Levarás contigo)

Levarás contigo
Meus olhos tão velhos?
Ah, deixa-os comigo
De que te servirão?
.
Levarás contigo
Minha boca e ouvidos?
Ah, deixa-os comigo
Degustei, ouvi
Tudo o que conheces
Coisas tão antigas.
.
Levarás contigo
Meu exato nariz?
Ah, deixa-o comigo
Aspirou, torceu-se
Insignificante, mas meu.
.
E minha voz e cantiga?
Meu verso, meu dom
De poesia, sortilégio, vida?
Ah, leva-os contigo.
Por mim. 
.
Hilda Hilst | "Ode XI (Levarás contigo)".
.

Ode XXIV (No meio-dia te penso)

No meio-dia te penso.
Íntima te pretendo.
Incendiada de mim
Contigo morrendo
Te sei lustro marfim e sopro.
E te aspiro, te cubro de sussurros
Me colo extensa sobre tua cabeça
Morte, te tomo.
.
E num segundo
Ouvindo novamente os sons da vida
Nomes, latidos, passos
Morte, te esqueço.
E intensa me retomo sob o sol.
.
Hilda Hilst | "Ode XXIV (No meio-dia te penso)".
.

miércoles, 8 de marzo de 2017

Ode XVII (Rasteja, voa, passeia)

Rasteja, voa, passeia
Com toda lenteza
Sobre a minha Idéia.
.
Em espiral
Oblonga, retilínea
Te recrio terra
Sobre a minha Idéia.
.
(Caracol de sumos
Andorinha
Crina)
.
Vagueia sobre a minha Idéia
E não sei se flui
.
Poreja
.
Única, primeira
Num mosaico de teias.
.
Se infinita sobre a minha Idéia
Se assemelha à Vida.
.
Hilda Hilst | "Ode XVII (Rasteja, voa, passeia)".
.

Ode XIX (Se eu soubesse)

Se eu soubesse
Teu nome verdadeiro
.
Te tomaria
Úmida, tênue
.
E então descansarias.
.
Se sussurrares
Teu nome secreto
Nos meus caminhos
Entre a vida e o sono
.
Te prometo, morte,
A vida de um poeta. A minha:
Palavras vivas, fogo, fonte.
.
Se me tocares,
Amantíssima, branda
Como fui tocada pelos homens
.
Ao invés de Morte
Te chamo Poesia
Fogo, Fonte, Palavra viva
Sorte.
.
Hilda Hilst | "Ode XIX (Se eu soubesse)".
.

lunes, 6 de marzo de 2017

Ode I (Corroendo)

Corroendo
As grandes escadas
Da minha alma.
Água. Como te chamas?
Tempo.
.
Vívida antes
Revestida de laca
Minha alma tosca
Se desfazendo.
Como te chamas?
Tempo.
.
Águas corroendo
Caras, coração
Todas as cordas do sentimento.
Como te chamas?
Tempo.
.
Irreconhecível
Me procuro lenta
Nos teus escuros.
Como te chamas, breu?
Tempo.
.
Hilda Hilst | "Ode I (Corroendo)".
.

Ode II (Passará)

Passará
Tem passado
Passa com a sua fina faca.
.
Tem nome de ninguém.
Não faz ruído. Não fala.
Mas passa com a sua fina faca.
.
Fecha feridas, é ungüento.
Mas pode abrir a tua mágoa
Com a sua fina faca.
.
Estanca ventura e voz
Silêncio e desventura.
Imóvel
Garrote
Algoz
.
No corpo da tua água passará
Tem passado
Passa com a sua fina faca.
.
Hilda Hilst | "Ode II (Passará)".
.